Asma ocupacional
DEFINIÇÃO
DA DOENÇA – DESCRIÇÃO
Asma
ocupacional é a obstrução
variável das vias aéreas, induzida por agentes inaláveis, particulares a um
dado ambiente de trabalho, na forma de gases, vapores ou fumos (II Consenso
Brasileiro no Manejo da Asma, 1998).
Pode ser classificada em duas
categorias: asma ocupacional propriamente
dita, caracterizada por limitação variável do fluxo de ar e/ou
hiper-responsividade brônquica, desencadeadas no local de trabalho e não por
estímulos externos, e asma agravada
pelo trabalho, que ocorre em indivíduos previamente asmáticos, que é
agravada por irritantes e/ou sensibilizantes presentes no local de trabalho.
A asma ocupacional pode
ocorrer em indivíduos com asma preexistente ou asma concorrente,
após exposição ocupacional. Os mecanismos descritos na asma ocupacional são:
BRONCOCONSTRIÇÃO REFLEXA: ação
direta de partículas sobre a parede brônquica. Ocorre em indivíduos com
hiperreatividade brônquica ou com asma prévia;
BRONCOCONSTRIÇÃO INFLAMATÓRIA:
exposição a irritantes presentes no ambiente de trabalho levaria a inflamação
das vias aéreas, acompanhada de hiper-reatividade brônquica. Há controvérsia em
relação à esses casos, que seriam considerados síndrome de disfunção reativa
das vias aéreas;
BRONCOCONSTRIÇÃO FARMACOLÓGICA:
alguns agentes atuariam como agonistas farmacológicos. Exemplos:
organofosforados, por inibição da acetilcolinesterase;
BRONCOCONSTRIÇÃO IMUNOLÓGICA: é o
tipo mais comum, mediado por IgE e, ocasionalmente, por IgG ou por imunidade
celular. O alérgeno liga-se à IgE, que, em contato com mastócitos e basófilos,
libera mediadores inflamatórios (histamina, prostaglandina, leucotrienos) e
quimiotáxicos responsáveis por broncoconstrição ou desencadeia reações mediadas
por IgG ou por linfócitos.
EPIDEMIOLOGIA
– FATORES DE RISCO DE NATUREZA OCUPACIONAL CONHECIDOS
A prevalência de asma
ocupacional varia na dependência do agente. Foram descritas prevalências de
50 a 60% em trabalhadores expostos a enzimas proteolíticas e 4% em
trabalhadores expostos ao cedro vermelho.
Considera-se que o aumento da
ocorrência de asma ocupacional estaria relacionado com o aumento de
novos produtos químicos na indústria, simultaneamente ao avanço nos métodos
diagnósticos. O número de substâncias causadoras da asma ultrapassava
200 no início dos anos 80 e agora estima-se em mais de 300.
Os principais agentes etiológicos
da asma ocupacional estão listados a seguir e, praticamente, são os
mesmos listados na rinite alérgica:
• carbonetos metálicos de
tungstênio sinterizados;
• cloro gasoso;
• cromo e seus compostos
tóxicos: os principais problemas são as névoas de ácido crômico provenientes
de banhos de cromeação;
• poeiras de algodão, linho,
cânhamo ou sisal (principalmente na fiação e tecelagem);
• acrilatos;
• aldeído fórmico e seus
polímeros: o aldeído fórmico ou formol é volátil e usado na conservação de
tecidos, nos laboratórios de anatomia, como matéria-prima em alguns processos
na indústria química, podendo ainda ser proveniente de reação de polimerização
de algumas resinas sintéticas, como, por exemplo, no Sinteko;
• aminas aromáticas e seus
derivados: corantes (Azo-dyes) usados em alimentos, remédios e tecidos;
• anidrido ftálico;
• azodicarbonamida: utilizada
na fabricação de artefatos de borracha para torná-la mais macia (sandálias,por
exemplo);
• carbonetos de metais duros:
cobalto e titânio;
• enzimas de origem animal,
vegetal ou bacteriana;
• furfural e álcool
furfurílico;
• isocianatos orgânicos;
• névoas e aerossóis de ácidos
minerais (ácido sulfúrico, nitroso);
• níquel e seus compostos;
• pentóxido de vanádio: o
V2O5 é usado como catalisador na fabricação de ácido sulfúrico e no craqueamento
de petróleo nas refinarias. O V2O5 e
outros compostos de vanádio são encontrados no petróleo, havendo
exposição importante para os trabalhadores que fazem a limpeza dos resíduos
sólidos dos tanques de armazenagem de petróleo ou alguns dos seus derivados;
• produtos da pirólise de
plásticos, cloreto de vinila e teflon;
• sulfitos, bissulfitos e
persulfatos;
• medicamentos: macrolídeos;
ranitidina; penicilina e seus sais; cefalosporinas;
• proteínas animais em aerossóis;
• outras substâncias de origem
vegetal (cereais, farinhas, serragem, etc.);
• outras substâncias químicas
sensibilizantes das vias respiratórias.
A asma ocupacional pode
ocorrer em trabalhadores portadores de asma,
expostos em seu ambiente de trabalho a outros alérgenos desencadeadores do
quadro. Nesse caso, a asma seria uma doença relacionada ao trabalho, do Grupo III da Classificação de Schilling.
Outra possibilidade é a manifestação de asma sem história prévia da
doença.
O
trabalhador estará sensibilizado primariamente por agentes patogênicos
presentes no ambiente de trabalho, o que enquadraria a asma no Grupo I da Classificação de Schilling. Ambos os
quadros devem ser considerados equivalentes.
QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
Os sintomas mais
característicos são: dispnéia, tosse, sibilância, respiração curta, opressão
torácica, produção de secreção em pequena quantidade. Deve-se pensar na
etiologia ocupacional em todos os casos que se iniciam na idade adulta.
O diagnóstico de asma
ocupacional inclui o diagnóstico de asma e a relação entre asma e
trabalho. A história ocupacional revela relação entre a exposição e os
sintomas. O broncoespasmo pode ser imediato, ao final da jornada ou noturno. A
presença ou a ausência de sintomas durante os fins de semana, férias e fora da
jornada de trabalho são significativas para se obter o diagnóstico. Entretanto,
muitos pacientes apresentam componente inflamatório,
que leva semanas para
regredir, sendo que outros podem nunca mais deixar de ser asmáticos. Isso deve
ser considerado na exploração diagnóstica. Vale lembrar que a maioria dos casos
de asma ocupacional permanece sintomático mesmo após a correta
intervenção ocupacional.
Exames complementares:
RADIOGRAFIA DE TÓRAX:
exclui outras patologias e diagnostica infecções concomitantes;
ESPIROMETRIA: auxilia
no diagnóstico de asma e deve ser feita inicialmente em todos os
pacientes com suspeita da doença. Há diminuição do VEF1. Pode ser feita no
local de trabalho para medições seriadas de curta duração, porém não é prático;
RADIOGRAFIA DOS SEIOS
DA FACE: para afastar sinusite;
CURVA DE PEAK FLOW: é o melhor método para estabelecimento do nexo
causal. Deve ser feito pelo trabalhador durante o trabalho e fora dele. Se
possível, avaliar por duas semanas no trabalho e por mais duas semanas fora
dele. Algumas vezes, esse tempo de afastamento será insuficiente para obter uma
melhora na curva. A fidelidade do registro dos valores anotados pelo paciente é
criticável, visto que é passível de incorreções e manipulações. Outros fatores
que interferem são: o uso esporádico de medicações, como corticosteróides,
broncodilatadores e aqueles sujeitos a exposições intermitentes. Essas
variáveis devem ser consideradas
na interpretação dos resultados;
TESTES DE PROVOCAÇÃO
BRÔNQUICA: podem ser feitos com agentes inespecíficos ou com agentes suspeitos,
estes últimosde difícil padronização. Devem ser feitos em ambiente hospitalar,
com rápido acesso a medidas de ressuscitação. Normalmente, são restritos a
instituições de pesquisa;
TESTES CUTÂNEOS:
ajudam a identificar o indivíduo atópico.
TRATAMENTO E OUTRAS
CONDUTAS
Remover o trabalhador
da exposição. Recomendar a suspensão do tabagismo. O tratamento farmacológico
deve ser indicado em função da gravidade dos sintomas. Principais drogas
utilizadas:
CORTICOSTERÓIDES:
potentes antiinflamatórios, redutores da hiper-reatividade brônquica. A via
inalatória é preferida para o tratamento de manutenção e profilaxia pelo mínimo
de efeitos colaterais. Nas crises agudas, utilizar o tratamento via oral;
BRONCODILATADORES: a
via inalatória é a preferencial;
CROMOGLICATO
DISSÓDICO: antiinflamatório não-esteróide, administrado por via inalatória.
Deve ser administrado profilaticamente;
BROMETO DE IPRATRÓPIO:
broncodilatador;
METILXANTINAS:
broncodilatador utilizado quando houver falha dos corticóides e β agonistas
inalados.
Após o diagnóstico de
asma ocupacional, o trabalhador deve ser imediatamente afastado da
exposição suspeita, lembrando que se o mecanismo desencadeador for imunológico,
mesmo diminutas concentrações do agente podem gerar sintomas. Caso a
recolocação seja possível, o trabalhador deve retornar ao trabalho com
monitoramento clínico. Caso a recolocação não seja possível, deverá ser
definitivamente afastado do agente que gerou o quadro.
Eventualmente, quando
o mecanismo for irritativo, dose-dependente e medidas corretas de proteção
respiratória podem auxiliar no retorno à atividade.
A freqüência das
crises também deverá ser levada em conta na avaliação da natureza e do grau de
disfunção ou deficiência eventualmente produzidos pela asma.
PREVENÇÃO
As medidas de controle ambiental visam à
eliminação ou a redução da exposição a níveis considerados seguros,
por meio de:
• enclausuramento de
processos e isolamento de setores de trabalho;
• umidificação dos
processos onde haja produção de poeira;
• uso de sistemas
hermeticamente fechados, na indústria;
• normas de higiene e
segurança rigorosas com adoção de sistemas de ventilação exaustora adequados e
eficientes;
• monitoramento
ambiental sistemático;
• mudanças na
organização do trabalho que permitam diminuir o número de trabalhadores
expostos, o tempo de exposição e a redução de fatores de estresseg presentes no
trabalho;
• medidas de limpeza
geral dos ambientes de trabalho e facilidades para higiene pessoal, recursos
para banhos, lavagem das mãos, braços, rosto e troca de vestuário;
• fornecimento, pelo
empregador, de EPI adequados, em bom estado de conservação, nos casos
indicados, de modo complementar às medidas de proteção coletiva.
As máscaras
protetoras respiratórias devem ser utilizadas como medida temporária, em
emergências.
Recomenda-se a
verificação da adequação e do cumprimento, pelo empregador, das medidas de
controledos fatores de risco ocupacionais e de promoção da saúde, identificadas
no PPRA (NR 9) e no PCMSO (NR 7), além de outros regulamentos – sanitários e
ambientais – existentes nos estados e municípios.
O exame médico
periódico visa à identificação de sinais e de sintomas para a detecção precoce
da doença.
Além do exame clínico
cuidadoso, recomenda-se a utilização de instrumentos padronizados, como os
questionários de sintomas respiratórios já validados e os exames complementares
adequados aos fatores de risco identificados no ambiente. Medidas de promoção
da saúde e controle do tabagismo também devem ser implementadas.
Suspeita ou
confirmada a relação da doença com o trabalho, deve-se:
• informar ao
trabalhador;
• examinar os
expostos, visando a identificar outros casos;
• notificar o caso
aos sistemas de informação em saúde (epidemiológica, sanitária e/ou de saúde do
trabalhador), por meio dos instrumentos próprios, à DRT/MTE e ao sindicato da
categoria;
• providenciar a
emissão da CAT;
• orientar o
empregador para que adote os recursos técnicos e gerenciais adequados para
eliminação ou controle dos fatores de risco.
Ministério
da Saúde do Brasil. Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil.
Doenças
relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde /
Ministério
da Saúde do Brasil, Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil; organizado por
Elizabeth Costa Dias